segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Natureza

Foto: Adrian Borba

Eu mordi lábios
- muitos! - 
pescoços, orelhas e troncos
também pernas, pés
dedos até as pontas chupei

em cada extremidade e vão
ali gostosamente trabalhava
viciei-me nos sexos
quanto mais provei, mais quis
deliciavam-me as úmidas áreas

rejeições? Não! Nunca acolhi
dono desse meu corpo
farejo e sempre encontro
aquele que me é de agrado

egoísta? Talvez
porém nunca fui burguês
que dirá empregado

sustento-me da miséria alheia
causo reboliços fenomenais
multiplico xingamentos
desde tempos memoriais

recrio com prazer tamanho
toda atmosfera putrefata
também de nada me envergonho
gozo frente as corrupções e pragas

essa é a minha natureza vã
tão caprichosa e solícita

dos nomes nem me recordo
jamais gostei de listas...

Verme eu sou
até o resto do fim
enfim
consumirei por inteiro

Joice Furtado - 31/12/2012

domingo, 30 de dezembro de 2012

Passagem

Imagem: António Macedo

viajante estrela traçando céu
de quem a vê pedidos leva
montada em seu cavalo-quimera
cavalga através dos astros

nuvens na atmosfera
do pó dos mundos conhecedora
viu anéis de Saturno e Phobos
deitou-se no colo de Hera

enxergou Babilônia dos jardins suspensos
reis surgindo e bandidos levantando
guerras, mais guerras

testemunhou as civilizações todas
injustiças dos pobres humanos
clamam aos deuses, cospem feras
palavras

de todas as almas, viu um Santo
esse a quem já conhecia
formado no ventre do universo
entregou-se a raça fria
por Amor

viajante estrela
aí de onde habita
seio da galáxia longínqua
veja, as pessoas continuam as mesmas
barbáries assolam a Terra
pisoteiam as mentes

Veja. Isso dói bem sabe
mas não é cadente, longe fica
observe atenta a movimentação cíclica
vai! Tem a sina da passagem

Joice Furtado - 30/12/2012

sábado, 29 de dezembro de 2012

cAmada

Foto: Web
Rompe minha camada
atravessa pele-nervos
aqui há desassossego
em mim, hoje bem mais
tu és calma


brisa que vem no sereno
quando o coração palpita
aquela noite aflita
longe dos laços na cama


perfume noturno
entre damas da noite
jardins e grAmas
o solo respira segredos
notas da Lua


sou Vênus
ao meu amado vou
exalando notas


Entrego a rama
essa enfeita beirais namorados
de lá dos capinzais estrelas sorriem
espiam de perto balbuciante telhado


Ao longe, o céu ao chão toca
sussurrantes os lírios aquáticos
contam uns aos outros da estrela guia
atravessando o manto celeste borda
rendas de flores campestres


Aqui de peito nu, ombros e costas
rompe minha pele e me une
por mais pequenos-luares momentos


então seremos lumes no escuro
clarões de amor tateando o quarto.


Joice Furtado - 29/12/2012

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O bailado do poema

Foto: Juan Medina
Atravesso paredes
mais que fantasma ando
transparente

mágoas assolam meus olhos
viro cascata
choro
esse lençol que me habita

turvo com areias
ciscos levanto ao ar
sopro
terrores para longe
angústias assassinas

rebroto somente
espalho-me pelas margens
papel meu esse
mudo ribanceiras de lugar
abraço os peixes

/ sinto no leve bailado do poema a força
concernente ao suspiro
Esperança /

traço essas más linhas
um chá de mato-raro
feito para apaziguar sangrias

desatada sou
não me ponham amarras
grito feito louco em crise aguda 
Alardeio ais interiores

Joice Furtado - 28/12/2012

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Poema das flutuações

Imagem: Juan Medina

A curva dos olhos
nos olhos
linhas
curvilíneas 

pétalas de flores
de flores
no peito
pétalas macias

pastilhas na calçada
na calçada onde passo
mais ilhas
bolhas dos humanos

nas orelhas brincos
brinco contigo
dependuro-me na íris
arco-canto

no céu eclipse
eclipse enluarado
vexado sol esconde
da Vênus a nudez
branca

na tez o pálido
branco pálido
abre-se o pálio
palpita

nas transparências da alma
da calma onde te vejo
transparências
cama e cheiro
exala fragrância
ensaio
dizeres apaixonados
e além

no inverno, o frio
frio-me faz
ausência
ainda hoje direi
verão que me faz bem
ranhuras e inconsequências
sobre a pele, sobre o sexo
sobre os nervos das palavras
dedos afiados

no jasmim tão puro
não jaz desejo
Vivo em mim 
Poético
por isso digo, vivo
nele também

Poema
assim, tu me voltas
nas voltas tuas
volta!
torna noites, nupcias 
sono perdido em alegria
goles mais goles
nas voltas que dá
o tempo
em ti eu paro-danço
enquanto tu me voltas
flutuas

Joice Furtado - 27/12/2012

Árvores de desejos

Imagem: Juan Medina

Às primeiras horas da manhã, o quarto sussurrava, soava juntamente com o canto dos passarinhos que se refestelavam na árvore de amora do quintal, essa que estendia seus ramos até a janela do presente recinto. Galhos compridos e lisos, com folhas largas, lembrando o formato de corações. Sim, corações verdes-claros com seiva pulsando, uma usina transformando gás carbônico em oxigênio de maneira harmônica, tal qual uma ária de Bach. Roupas espalhadas pelo chão, um vestido floral dependurado na penteadeira, calcinhas e sutiãs recriavam um mosaico por todo aquele lugar. Os lençóis amassados, lençóis bege, tão claros que refletiam a luz do sol que entrava pela janela e realçava o ambiente. Da mesma maneira, a brisa leve e úmida com cheiro da chuva que havia caído durante a madrugada emanava impressões as quais memoriavam à pintura, paisagem envolvente que os que vissem ficariam inebriados e se sentiriam impulsionados a se misturarem ao torpor. Corpos tocavam-se além do quarto, no banheiro conjugado revestido de vidros jateados com desenhos florais e arabescos. Nuvens de vapor d'água subiam do box, condensavam-se e se tornavam gotículas beijadas pelos raios de sol da manhã, semelhantes a moços curiosos escorrendo através do vidro. O barulho da água ao cair no chão misturava-se aos sons de mãos deslizando por vãos, lábios e línguas em frenesi. Uma visão extremamente sensual, com tons de perversão, tons fortes mas, ao mesmo tempo, lânguidos, líquidos. Rosados pêssegos, firmes e suculentos pomos tais quais frutos de árvores de desejos. Ali onde a natureza humana sobressaia a qualquer paradigma ou conceito pré-concebido, onde o exalar dos amantes era o sexo em sua mais significativa forma. Naquele exato momento nada mais era superior e importante não passava de um substrato etimológico, apenas uma palavra do dicionário substituída por "necessário", desesperadamente necessário, termo esse suspirado pelo ambiente, adentrando paredes, portas e fechaduras. Nuas Vênus com unhas afiadas encharcavam-se uma na outra, submergiam e emergiam, lindas roupas delicadas, sedosas. Liquefaziam-se e se satisfaziam atravessando os minutos, vales, banhados, corredeiras e veios. Eram rios cristalinos ou mares onde caravelas flutuam e peixes alimentam-se na água morna.  Entre gemidos e estalidos de beijos, o anseio mais íntimo, mais profundo de suas carnes, de suas mentes povoadas das mais ardentes frases. Repetiam quase como um mantra, uma oração profana ou não, dependendo da capacidade das mentes em interpretar o querer das almas, o que as completa. Insistentemente, repetiam entre mordidas, bocas e sexos, lubrificando ações, algo que faria o mais romântico enternecer-se por elas e entrar com prazer em seus aposentos róseos sentindo-se rei e/ou rainhas na presença de princesas da luxúria e sedução. Duas palavras apenas, um só segredo, esse capaz de erguer e derrubar montanhas: Me ama! Aaaah! Me ama! 

Joice Furtado - 27/12/2012

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Vestido de strass

 
Imagem: 2photo.ru 
(Arte final - Joice Furtado)

A tarde chega e as últimas luzes atravessam a janela para onde olho. Penso, questiono. Várias imagens passam por minha mente no exato momento, talvez nem tão exato, mas no momento quando enxergo a luz que toca meu rosto, luz essa, ainda morna. Ali, quando a mente divaga e parece que está vazia. Quando tudo que se quer torna-se diminuto diante da claridade radiante daquela esfera celeste entrando pelo vítreo. Magoo-me ante o que já foi e o que gostaria que fosse. Ridicularizo o pensamento anterior. Invento argumentos que justifiquem atitudes, volteio e volteio. Sou um bambolê! Sorrio agora. Eu imaginativa estou presente. Multiplico alegrias ainda que a matemática não seja minha amiga. Divido com milhares algo de mim, esse que julgo ser bom, porém há muitos que discordam dessa interpretação, "muitos" que não me mostram um ínfimo sequer para desaprovar o que vem da maioria. Paro com sandices! Tolices demais me deixam zonza. Olho para a janela. A tarde chega e com ela o vazio que se evapora quando surge a noite, esperança de um novo ciclo, quando a lua desabotoa o elegante vestido negro com strasses os quais são estrelas inventadas pelos homens. Aqui o estro, mais que cio, mais que fome, apetite voraz percorrendo todos os nervos. De continente a continente, a fúria poética corre, discorre seus clamores e canta... palavras diferentes a cada renascer do corpo. Células vermelhas -  luas cheias, contudo tão novas.

Joice Furtado - 26/12/2012

Taça de impressões

Foto: Web

Minhas impressões afixo
em papéis de folhas...
há sonhos
mil

com-passos marcados
na vida, os desagravos
ensinam-nos a Ser
- isso tem grande valia - 

com-passos distintos
uns curtos, outrossim compridos
traços do seio ardente

sangue, esse impulsiona
veias
válvulas
artérias da matéria que sente

/ e se revolver, pois sempre é agora
e hoje, esse exato momento /

tão somente
sente
tal qual as batidas do coração poeta

Minhas impressões afixo
em papéis de linho-
unidas linhas 
com lápis ou caneta
também suores, lágrimas
curvas dos olhos, do corpo
copo da insPiração que retine!

justamente essa, só essa
a maior de todas as constatações

/ Todos somos um pouco loucos.
O diferencial é o que fazemos com essa loucura. / 

Joice Furtado - 26/12/2012

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Enseadas

Foto: Bellissime Immagini

Um mergulho
vazio nefando
perambulo oceAnos
sem fim


continentes estranhos
- sem teus braços Amor -
Náufrago das dores
Sou

Monstros lendários
hipócritas e suas crises
tão normais

Condenso tempestades - cúmulos nimbos -
estou

Torna ao extrato
Meu interior Atlântico
vagueia

Mova continentes
Mas venhas, cedo venhas
sobre espumas do mar
até mim

descansemos à tarde
manhã de gozo
protegidos do abissal transtorno

apaixonados somos 
enseadas quentes

Joice Furtado- 17/12/2012

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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Páginas-nuas


Encaixas
desEncaixas

Nas tuas ondas Vo(o)
ninando sonhos
expectativas chegadas
tristezas despedidas

recobro vida
clareio olho(s)
teus acolhimentos
são
pétalas de desejo
íntimo oceano

tuas páginas em um livro
muitas tranças
nesta cabeça
papéis de cartas

a caixa aberta está
Coração pulsando

Inspirado no livro Encaixes da amiga Carmen Silvia Presotto.

Joice Furtado - 14/12/2012

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Varal de estrelas



Foto: Flick

Eu me recolho
feito lírio ao chão
planto-me de novo
aqui espero

Eu me recolho
em afazeres meus
suspiro
pelo invisível encontro
ei-lo em mim

vibrando

sinto teu pensamento
habita este interior
volteio
e nas tuas curvas passo
milhas passeio
banho de céu em mim
alua-
me faz querida

continuo amando

... no firmamento mental estendo-a
varal no peito
estás brilhando!

Joice Furtado - 13/12/2012

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Para ti


Imagem: Web

Foi para ti 
que desfolhei a chuva 
para ti soltei o perfume da terra 
toquei no nada 
e para ti foi tudo 

Para ti criei todas as palavras 
e todas me faltaram 
no minuto em que talhei 
o sabor do sempre 

Para ti dei voz 
às minhas mãos 
abri os gomos do tempo 
assaltei o mundo 
e pensei que tudo estava em nós 
nesse doce engano 
de tudo sermos donos 
sem nada termos 
simplesmente porque era de noite 
e não dormíamos 
eu descia em teu peito 
para me procurar 
e antes que a escuridão 
nos cingisse a cintura 
ficávamos nos olhos 
vivendo de um só 
amando de uma só vida 

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Conjugados

Foto: Odile de Schwilgue

chorando teus poemas
(lágrima conjugada)
andei
musicando sentimentalismos
(tão meus)
nos teus traços esparramo-me
íntimo significado

as batidas do peito, doridas
magoo-me quando não vens
projeto despedidas
- como se a conhecesse por longos anos -

onde há assombro
também melancolia
florescerá a semente que o vento leva?

canto
voz rouca de amor
é desejo!

o espelho côncavo
desmistifica os hábeis ângulos
do rígido faz sem métrica
sem jeito ando...

se jeito é ter que falar tudo
repetir teoria
engolir sapos malucos
agonizo

não tenho jeito
nem vergonha
(condenso palavras sentidas e...
chovo)
prefiro o Ser
poesia

Joice Furtado - 11/12/2012

A esfera

Foto: Odile de Schwilgue
Leite em pó
poeira da Lua
queijo roído
sorri do céu


São Jorge cavalga
imaginário lúdico
Lua
teu pensar no papel
- delineio -


formosura enamorada
observo da água
- observar é arte
para quem a ti não chega -
repara a clareira
dos olhos teus
luzindo os meus


impressiona o lago
reflete
branqueia com banho
raios celestes
meu amor no teu
suspiro nua!
... por ti Lua


martelo o cinzel
/ moldo - me
contente /
Entalho a esfera
... dos sonhos


Joice Furtado - 22/10/2012

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Através dos tempos

Foto: A.D. Cook

O amor que se cultiva
na alma brota
firma raízes
florescendo sempre
através dos tempos

vejo teus olhos
meninos de cor
essa mesma
habita os sonhos

onde o tenho
quando o tenho
porque TER é verbo
mEU possessivo proNome

embolo-no pelos cabelos
faço tranças delirantes
imagino
- sobrevive o sonhador -

amor cultivado
na cAlma ou alvoroço
por estações mantido
invernos de choros
verões de desejo
luas que passam
e chegam

eis teus olhos aqui
rodeando sentidos
afaga meus seios
não sufoco o grito
medo
pois bem sabe que sim
através dos tempos
sigo

e amo
... pois essa é a vantagem
de manTê-lo ...
cintilo fantasias contigo
não há decepções
quando o chamo vens
inunda meu peito

salivo as ideias mais doces
por atreVidas ta(m)bém
Marejas-me
asSim mergulho

Joice Furtado - 07/12/2012

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Rearranjo

Foto: Web

O livro
sonho de consumo
ou realização?

própria
alma derramada
em letras espalhada
esparramados traços no papel
de sonho, olhos e saliva
batidas cardíacas

tum tum
raro tesouro é o sentir
profund(a)Mente

disseram-me: guarda a sabedoria
aquela vontade de aprender
e o que conhece ninguém lhe tira
ninguém rouba
o que vai dentro de você

em cada trilha
cada curva, transversal
seja aqui, ali, até no plano astral
claro, para os entusiastas

leitura pela qual engatinho
por viagens interiores moldada
não conheço muito e o bom é -

que se esta a qual agora escrevo não for toda minha expressão,
pulo daqui para lá, acendo lamparinas espaço-mentais
(um desejo, por favor!)
rearranjo-me de novo. -

Joice Furtado - 05/12/2012

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Colores

Imagem: António Macedo

A cor
da
cor
A cord(a)
corda
cor
(laço)

Acorda
A-
corda
(plim!)

A cor dá
cor
(coramos!)

Acor-da
A-cor-da
(Abra os olhos)

A cor
dá amor no sereno
caem
faíscas da noite
poeira do sono
salpicadas estrelas no rosto

rosa-flor-rosa
Abrem-se as pétalas
meninas da vista
o arco-íris
A cor
da cor


A cor-de(l)
Acor
de
(Linda música!)

Acordemos
(de cor, ora, de cor-
ação)
A cor, damos?
Bom dia, meu amor

Joice Furtado - 04/12/2012

Si yo pudiese descobrir todas colores del amor

saber se es blanco como o paz

ó azul color del mar....

Colores del Amor - Voices

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

De sangue

Imagem: A.D. Cook

Sinto teu cheiro
o corpo estremece
beijo de chuva
sereno no ar

refrigério da alma
- terra minha - 
sorrio pelas ruas
embalada neste som
correrias e buzinas

Sinto teu cheiro
o peito aperta-me
afago de lua
no rio espelha

Amo-te por hoje
por hora
em cada centelha

és do meu sangue
dispõe átomos
etérea 
viajante vida

irmã, em verdade

... sinto tantas saudades

Joice Furtado - 03/12/2012